Por Carla Maria*
No início deste ano, depois de tanto tempo de isolamento devido a pandemia, a equipe do Quero na Escola realizou algumas visitas para falar do programa, ver e ouvir comunidades escolares. Desde que comecei a fazer parte do Quero na Escola, eu me questionava: como teria sido ter atividades extracurriculares a partir do que eu queria aprender no meu tempo escolar? O tempo não poderia voltar e eu mesma trilhei outros caminhos para acessar mais assuntos, mas agora eu poderia vislumbrar uma resposta ao apresentar essa oportunidade para estudantes no espaço onde estudei.
Foi assim que voltei a escola estadual em que fui aluna até 2012, a Lourival Gomes Machado, no Jardim Arpoador, zona oeste de São Paulo. Havia visitado o local apenas esporadicamente porque ainda é meu local de votação. Nesses raros momentos, percebia algumas reformas como grafites nos muros, pinturas nas paredes internas e reforma da quadra. Foi somente ao pisar na escola como representante do Quero na Escola que percebi como estava totalmente diferente do que aquela garota negra de periferia conhecia há 10 anos atrás.

Descobri um local aberto para diálogo com a gestão e o interesse de estudantes por projetos para a comunidade escolar, ações do grêmio estudantil e soube que, antes do período de pandemia, houve a realização de saraus. Por conta desta visita, dois estudantes que há tempos desejavam ocupar a escola com demandas específicas, que extrapolam o esquema engessado de aulas e base curricular, enviaram suas demandas por meio do site do Quero na Escola, que é aberto a qualquer estudante de escola pública do país.
Uma delas foi por atividade de programação, um pedido do Enzo Rudolf Cughele, do 3º ano do Ensino Médio. Conseguimos localizar uma voluntária que toparia realizar a ação. A Adriana Lippi, oceanógrafa, programadora web e moradora de Pinheiros, também na zona oeste de São Paulo, foi até a escola. Contamos com a articulação da coordenação e colaboração de professores no momento.
Foram 14 estudantes do Ensino Médio participando da ação. Alguns já com conhecimentos na temática, outros apenas começando, mas todos ávidos pelo o que poderiam aprender com a Adriana. Eles tiveram uma introdução à lógica de programação e criaram seus respectivos currículos em uma página para Web, além de terem dicas de sites gratuitos para aprender a programar.

Apesar de não saber absolutamente nada de programação, fiquei tão envolvida com a ação quanto os participantes. O professor de informática atrasou sua saída e estudantes deixaram de participar da tão esperada aula de educação física para estar na atividade e sequer perceberam que as duas horas de ação extrapolaram o horário.
Os computadores foram desligados com a promessa da Adriana voltar na semana seguinte para um segundo encontro e o anseio dos estudantes em solicitarem mais atividades.
Dez anos depois, foi o programa Quero na Escola a ponte que possibilitou tanto esse meu retorno à Lourival Gomes Machado sendo uma das pessoas possíveis a contribuir com a comunidade escolar, como também valorizar o protagonismo estudantil que há tempo dizem o que desejam aprender, no caso programação e muitos outros temas.
*Carla Maria é coordenadora de projeto na Quero na Escola, historiadora, pesquisadora e oriunda da escola pública